A frota de veículos sinistrados com indenização integral por colisão ultrapassou 1 milhão de veículos em 2019, segundo dados da Superintendência de Seguros Privados (Susep)[1]. No entanto, apenas uma parcela mínima desses automóveis passou pela inspeção veicular obrigatória e obteve o Certificado de Segurança Veicular (CSV). O cenário escancara uma falha estrutural na classificação dos danos de veículos sinistrados como um todo, e no controle de sinistros sem vítimas, o que reforça a importância do novo CST – Comunicação de Sinistro de Trânsito, sistema digital lançado pela Polícia Rodoviária Federal, em vigor desde 1.º de julho de 2025.
Acidentes sem vítimas ou sem a efetuação de boletim de acidente de trânsito (BAT) não geram classificação de danos nos veículos, assim como também não entram para as estatísticas da Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran) sobre restrições administrativas. Estados com grandes frotas apresentam números ínfimos de restrições administrativas em veículos sinistrados com danos de média monta, conforme os dados de 2024: Foram 11.295 veículos em São Paulo, 956 veículos em Minas Gerais, 2 na Bahia e nenhum no Rio de Janeiro.
Daniel Bassoli, diretor executivo da Federação Nacional da Inspeção Veicular (FENIVE), explica que, ainda que em menor escala, todos os estados enfrentam o mesmo problema, com carros comprometidos estruturalmente circulando livremente, muitas vezes revendidos no mercado sem qualquer alerta ou histórico visível ao comprador.
“O CST é um passo essencial para corrigir essa falha. Ele formaliza o registro de acidentes sem vítimas em rodovias federais e permite que o dano ao veículo seja classificado, o que abre caminho para um controle mais efetivo. Mas ainda há muito o que fazer para classificar corretamente os danos dos veículos acidentados, como realização de boletim de acidente de trânsito em toda a frota sinistrada”, afirma.
Falta de controle
Antes da criação do CST, grande parte dos acidentes sem vítimas não gerava registro formal pelas autoridades, pois são considerados episódios de baixa relevância. Sem boletim com fotos ou inspeção, veículos com danos estruturais severos costumavam ser reparados e retornavam à circulação, o que representa risco à segurança de motoristas, passageiros e pedestres. Em alguns casos, os veículos sinistrados eram revendidos pelo valor integral de mercado, sem qualquer menção ao sinistro.
“É um risco real e recorrente. A falta de registro permite fraudes e compromete diretamente a segurança no trânsito”, afirma Bassoli. “O consumidor que compra um carro recuperado de um sinistro grave sem saber, está sendo enganado e ainda colocando sua vida e de outras pessoas em risco”, analisa.
Bassoli afirma que o modelo adotado pela PRF deveria ser adotado, inclusive, por órgãos de fiscalização de trânsito estaduais e municipais. “É fundamental que o CST seja ampliado. O problema não se limita às rodovias federais”, defende Bassoli.
A medida encontra respaldo na Resolução 810/2020 do Contran, que exige que todo veículo envolvido em acidente seja avaliado para classificação do dano e quanto à sua possibilidade de retorno à circulação. No entanto, a norma ainda esbarra na ausência de integração entre sistemas e na falta de exigência de imagens nos boletins eletrônicos. “Sem foto, sem laudo, sem inspeção. É assim que veículos avariados continuam escapando do controle técnico”, alerta.
De acordo com Bassoli, a expectativa é a de que o CST sirva como modelo de padronização, integrando bancos de dados dos Detrans, seguradoras e órgãos fiscalizadores. Com isso, será possível rastrear sinistros, exigir inspeção quando necessário e garantir que apenas veículos seguros voltem a circular. “O CST ajuda a proteger o consumidor e a preservar vidas”, conclui.