Por Alysson Coimbra*
Pisar fundo no acelerador, ignorar o sinal vermelho, usar o celular ao volante - infrações de trânsito são assustadoramente comuns seja nas ruas, estradas ou avenidas do Brasil. Mas por que tantos insistem em desobedecer as leis, colocando em risco a própria vida e a de outras pessoas? A resposta pode estar na Síndrome do Pensamento Acelerado (SPA), um fenômeno cada vez mais presente em nossa sociedade.
A SPA, que afeta uma parcela significativa da população, é caracterizada por um fluxo incessante de pensamentos, criando um estado mental de constante agitação. Viver em alta velocidade parece ser a regra, não a exceção. Estamos constantemente bombardeados por informações, cobranças e estímulos, presos em uma rotina frenética que molda até mesmo o nosso cérebro. Esse estilo de vida, afeta diretamente o nosso comportamento no trânsito, levando-nos a cometer infrações mesmo cientes dos riscos.
Imagine uma avenida movimentada. Carros buzinando, pedestres apressados, semáforos piscando. Para quem sofre de SPA, o excesso de informação impede um processamento adequado, resultando em decisões impulsivas e falta de atenção. A mente acelerada busca atalhos, ignorando o bom senso e a prudência.
A pressa e a impaciência se tornam companheiras constantes. E as infrações viram comportamentos frequentes, justificados por uma ilusão de controle e pela crença de que as regras não se aplicam a nós.
A mente acelerada, como um disco rígido fragmentado, substitui facilmente informações antigas por novas, especialmente em ambientes que normalizam comportamentos de risco. Se estamos rodeados por pessoas que ignoram as leis de trânsito, a tendência é internalizarmos essa conduta como aceitável, mesmo que contrarie nossos valores. Isso acontece porque a SPA provoca um estado de exaustão mental que reduz drasticamente a capacidade de resistir à pressão social, levando a pessoa a adotar crenças ou comportamentos que, em um estado mental mais equilibrado, ela resistiria.
Sem o conhecimento adequado sobre os impactos da aceleração mental e sem ferramentas para gerenciar o estresse, as emoções e a impulsividade, tornamo-nos reféns de um comportamento autodestrutivo. Isso acontece porque quando nossa mente está acelerada, fica mais suscetível a aceitar passivamente novas ideias sem o processo de validação que ocorre quando a reflexão crítica está presente.
Mudar esse cenário exige conscientização. Precisamos entender como a síndrome impacta nossas vidas e buscar ferramentas para controlá-la. Práticas como a atenção plena (na qual treinamos nossa mente para se concentrar no aqui e agora, observando nossos pensamentos e emoções sem julgamento), técnicas de respiração para atingir o equilíbrio, o autoconhecimento e o desenvolvimento da gestão da emoção são essenciais para desacelerar a mente e ter mais clareza nas decisões e nas ações cotidianas.
Por que as campanhas não são assertivas?
Quando nossa mente está confusa, as campanhas educativas não surtirão efeito. Isso acontece porque a ausência de consciência crítica prejudica a capacidade de entender e absorver as mensagens, o que é indispensável para produzir uma matriz de transformação que provoque mudança de comportamento. Assim, o gargalo maior está no fato de as campanhas não aprofundarem suas mensagens de acordo com as questões emocionais, culturais e sociais dos motoristas brasileiros.
Por isso, é fundamental investir em programas de educação no trânsito que considerem a síndrome e seus impactos. Campanhas informativas, simulações realistas e o uso de recursos digitais podem conscientizar motoristas sobre os perigos da aceleração mental e oferecer ferramentas para uma conduta mais segura e responsável.
A responsabilidade é individual e coletiva, cada um dirigindo o veículo da sua mente como um bom piloto, com planejamento do percurso e gestão da velocidade de acesso às informações. Assim assumiremos o controle da própria mente e promoveremos uma cultura de respeito no trânsito, transformando-o em espaço coletivo mais seguro para todos.
*Alysson Coimbra é médico especialista em Trânsito, diretor científico da Ammetra, palestrante e especialista em segurança viária.
Imagem: Por que o Por que o brasileiro insiste em dirigir após beber? Freepik - Divulgação Ammetra